quinta-feira, 1 de setembro de 2011

EIKHAH (LAMENTAÇÕES). E: YIRMEYAHU (JEREMIAS);

INTRODUÇÃO AO LIVRO DE:






JEREMIAS







INTRODUÇÃO







Visão geral

Autores: Jeremias e Baruque, seu aluno e/ou escriba.

Propósito: Lembrar aos exilados os motivos de suas provações e garantir-lhes que, ao se arrepender, o povo de Yaohu voltaria para a Terra Prometida com grandes bênçãos.

Data: 580-539 a.C.

Verdades fundamentais:

O exílio na Babilônia foi merecido, pois o povo de Judá e Jerusalém persistia no pecado.

O templo em Jerusalém não protegeria os habitantes de Judá do julgamento de Yaohu contra eles por sua hipocrisia.

O povo devia recusar os falsos profetas que proclamavam paz e segurança e aceitar a mensagem dos verdadeiros profetas.

A decisão divina de mandar o seu povo para o exílio seria seguida de restauração maravilhosa sob uma nova aliança.







Propósito e características

As fases da mensagem de Jeremias não correspondem exatamente à estrutura do livro.

(1) Ele chamou Judá a se arrepender a fim de evitar o julgamento que, de outro modo, certamente lhe sobreviria (p. ex., 7,1-15).

(2) Anunciou que o tempo de arrependimento havia passado e que a decisão divina contra o povo já havia sido tomada (19,10-11). O julgamento é o tema dominante do livro, sendo entendido como invocação da maldição mais grave da aliança, ou seja, a perda da Terra Prometida (Lv 26,31-33; Dt 28,49-68).

(3) O ETERNO salvaria o seu povo, ou um remanescente do mesmo, por meio do exílio (24,4-7). Os babilônios prevaleceriam sobre Judá segundo a ordem do ETERNO, mas só por algum tempo. A Babilônia também cairia (25,9.11-12), o que isto de fato ocorreu em 539 a.C., quando os babilônios foram derrotados por uma coalizão de persas e medos sob o comando de Ciro, preparando o caminho para a volta dos exilados (50,3; 51,1.27-28; 2Cr 36,20-23). Essa foi a resposta de Jeremias aos falsos profetas que contestavam a sua mensagem de julgamento (28,2-4).

Jeremias também anunciou uma mensagem de salvação, dirigida apenas àqueles que sobreviveriam ao julgamento (29,11-14). Essa mensagem se consolidou na profecia da nova aliança (31,31-34). Que é estruturada em torno dos elementos principais da aliança mosaica no Sinai.







CHRISTÓS – “O UNGIDO” –, EM JEREMIAS.

(Yaohushua):



A mensagem de Jeremias antevê O UNGIDO principalmente na certeza de restauração do exílio expressada pelo profeta. Ao mesmo tempo em que deixa clara a iminência do exílio, Jeremias também mostra que depois do mesmo o povo de Yaohu entrará num novo período da aliança repleto de bênção de Yaohu. O SALVADOR é o ETERNO – YAOHU – YAOHUSHUA da nova aliança (Lc 22,20; Hb 8,8; 9,5; 12,24), o filho de Davi e o Sacerdote que deu início às maravilhas dos últimos dias com o seu ministério aqui na terra. Nos dias de hoje, ele continua realizando esta obra de restauração que será completada quando ele voltar em glória Mt 4.







JEREMIAS.

1. A solidão do homem da Palavra. Ao leitor do livro que traz o seu nome, Jeremias se apresenta como um grande solitário. “Eu fico à margem”: são estes os termos que ele usa para caracterizar seu relacionamento com a sociedade (15,17). Incompreendido e perseguido, desamado por aqueles que mais deveriam apoiá-lo e encorajá-lo, os membros de sua família (12,6; 20,10), ele não está com eles quando celebram um casamento, nem quando choram um morto (16,5-9). Nunca chegará a conhecer o reconforto e a responsabilidade da vida conjugal e nunca chegará a ser pai (16,1-4). Preso, brutalizado, arrastado contra a vontade para o Egito, acabará seus dias numa terra longínqua e nenhum vestígio restará de sua tumba.

Entretanto, estamos muito bem informados sobre sua vida interior. Sabemos que essa solidão de modo algum, correspondia a uma disposição natural de sua parte. Foi-lhe imposta por uma força externa que o violentava, agredia, invadia, prendia, exigindo uma adesão total à sua vontade e que tinha necessidade de sua solidão como de um meio para agir no seio do povo de Judá. Essa força implacável era a Palavra de Yaohu. Nenhum profeta evoca a Palavra de Yaohu e sua maneira de agir com tamanha e dolorosa exatidão quanto Jeremias. “A Palavra do ETERNO veio a mim” – é uma fórmula freqüente em Jr, que introduz e qualifica seu discurso (cf. 1,2). “Ao encontrar tuas palavras, eu as devorava” (15,16); {faço de Jeremias, minhas palavras: “ACHADAS AS TUAS PALAVRAS, LOGO AS COMI; AS TUAS PALAVRAS ME FORAM GOZO E ALEGRIA PARA O CORAÇÃO, POIS PELO TEU NOME SOU CHAMADO, Ó “YAOHU”, DEUS DOS EXÉRCITOS”.}; embora elas o alegrem (15,16), seu feito é freqüentemente devastador: “Todos os meus membros estremecem, torno-me como um bêbado, um homem tomado pelo vinho, por causa de tuas palavras” (23,9). Esta palavra de provação, “parecida com o fogo, com uma marreta que pulveriza a pedra” (23,29; cf. 5,1 e nota) onde, na qualidade de profeta, tem o direito de entrar. Além do mais, o ETERNO a põe em seus lábios (1,9), velando sobre ela (1,12), para fazer dela um fogo que devore o povo recalcitrante (5,14). Às vezes, a Palavra parece abandona-lo, torna-se rara e lhe impõe longos dias de espera antes de voltar a comunicar-se (42,7). Na vida desse homem a Palavra tornou-se o fator-chave, o centro incômodo, desmancha-prazeres e ao mesmo tempo razão de ser, uma espécie de déspota imprevisível que, aparentemente, o aliena de si mesmo e de seus semelhantes para, de fato, mergulha-lo no centro mesmo da realidade.

É compreensível, então, que Jeremias tenha tido de fazer um esforço constante para assumir essa Palavra e para se assumir diante dela. Encontramos indícios disso nos numerosos diálogos que balizam o livro e nos quais o profeta discute asperamente com Yaohu sobre o sentido de sua existência de profeta. Os mais célebres são, sem dúvida, aqueles que os exegetas modernos denominam as “confissões de Jeremias” (11,18-23; 12,1-6; 15,10.15-20; 17,14-18; 18,18-23; 20,7-13.14-18). Nelas o profeta se queixa amargamente de seu isolamento, de sua “alienação”, da insignificância de sua condição, mas a resposta é que essa condição é inelutável e faz parte de sua missão profética. As “confissões” não são, contudo, os únicos diálogos entre Jeremias e seu Deus – Yaohu. Outros podem ser encontrados no começo do livro: a cena de sua vocação, quando o jovem Jeremias tenta em vão esquivar-se ao domínio da Palavra (1,4-10), e as visões iniciais, constitutivas de seu ministério (1,11-14), bem como a passagem em que o profeta é levado a reconhecer o bem-fundado do veredicto divino relativo à situação da sociedade de Judá (5,1-6), e aquela em que ele tenta em vão fazer cessar uma seca que devasta a terra (14,1 – 15,9). Nestes diálogos, a palavra do homem confronta-se com a Palavra de Yaohu, e é sempre esta que triunfa. Sejam quais forem as circunstâncias históricas de seu desenvolvimento – não é fácil penetrar a psicologia da experiência profética –, esses diálogos testemunham que a Palavra de Yaohu era uma preocupação constante de Jeremias.



2. A autenticidade da vocação profética. De todos os problemas que afetavam tal existência, o pluralismo das convicções proféticas era um dos mais dolorosos. Jeremias não era, de fato, o único que falava em nome do ETERNO. O próprio livro de Jeremias nos informa sobre a atividade de homens que, ao mesmo título de Jeremias e ao lado dele, reivindicavam o estatuto e os privilégios próprios de um profeta: Uriáhu ben Shemaiáhu (26,20-24), Hananiá ben Azur (cap. 28), Ahab ben Qolaiá e Sidqiá ben Maaseiá (29,21), e outros, profetas anônimos, mencionados em inúmeras passagens (2,8.26.30; 4,9; 5,13.31; 6,13-14; 26,7-16; 27,16-18), interpelados (23,9-40) ou citados por Jeremias (14,13), talvez até com aprovação (cf. 4,10 nota); alguns inclusive encontravam-se entre os deportados para Babilônia (29,1).

Os textos nos indicam em particular que, de início, Jeremias não pretendia absolutamente destacar-se de seus colegas profetas (cf. 14,13-16; 28,6-9; também 29,1), nem via motivos para qualifica-los de “falsos profetas”. Encontramo-nos aqui em presença de um aspecto particularmente delicado da solidão de Jeremias. Exceto uns critérios morais de aplicação delicada (23,14.17.22; 29,23), ele praticamente não dispunha de critérios objetivos que lhe permitissem distinguir o verdadeiro do falso, privilegiar sua mensagem em relação à mensagem de muitos outros, que defendiam a sua com tanta convicção quanto ele, a dele (cf. porém 28,8). Afinal, ele próprio podia errar, como o podia Hananiá, seu concorrente (28,6-9), ainda mais porque a opinião deste coincidia com a da grande maioria dos chefes políticos e militares (cf. a seguir, § 4b).

A questão da autenticidade e do sentido de sua vocação singular põe-se assim no centro de seus colóquios com Yaohu. Se Yaohu é inspirador das mensagens, por que elas não são unânimes? Se Yaohu enviou Jeremias, por que Jeremias é o único a proclamar uma verdade que só ele aceita como tal (o destino de um homem como Uriáhu, cf. 26,20-24, profeta assassinado por Joaquim, não era capaz de reconfortar Jeremias)? Se Yaohu credenciou seu profeta, por que ele sofre sevícias por parte daqueles que deveriam alegrar-se ao saudar nele um confrade ou o representante qualificado daquele que veneravam como Mestre? Está em jogo a identidade, a pertinência da revelação.

Jeremias não esconde sua confusão. No que diz respeito ao seu ministério, ele não é consciente de ter cometido erros. Por acaso não assimilou fielmente a Palavra, não a “comeu” (cf. 15,16)? Não foi sempre absolutamente sincero (17,16b)? Não intercedeu por seus semelhantes, até mesmo por seus adversários, como o faz todo verdadeiro profeta (18,20; cf. 14,13; 17,16)? Por que, então, conhece a triste sorte de um solitário, de um inadaptado, um eterno revoltado?

A resposta de Yaohu, peremptória, não oferece nenhuma justificação. Todas as suas desgraças são previstas por Yaohu e irão mesmo se agravar (12,5); o mensageiro contestado nada pode, a não ser refazer-se e seguir caminho (15,19-21), empenhando a própria pessoa em tornar seu discurso ainda mais incisivo (15,19). No que diz respeito aos outros profetas, o ETERNO, que não os credenciou (14,14-16), denuncia-lhes a impostura (23,16). Para dissipar as dúvidas que assolam a alma do profeta, resta somente a absurda certeza de que é realmente o Yaohu vivo que lhe fala.

Jeremias não viverá o bastante para saber que, uma vez acontecida a catástrofe que ele anunciara, os judeus iriam refletir sobre seu destino: alguns teólogos precavidos iriam colecionar não somente os oráculos dele, mas também as tradições relativas a seu ministério; ele terminará por ser considerado um profeta autêntico do ETERNO (cf. infra § 5).



3. Dados biográficos. Comparadas com esse conflito fundamental, as circunstâncias externas da vida do profeta apresentam um interesse apenas secundário. Aliás, elas são pouco conhecidas, e as conclusões que podemos tirar de alguns dados são, na maioria dos casos, conjeturais.

De acordo com 1,1, o profeta era originário de Anatot, pequena aldeia nos arredores de Jerusalém, onde sua família possuía algumas propriedades (cap. 32; cf. 37,12), e era membro de uma família sacerdotal. Chegou-se a deduzir que Jeremias fosse parente longínquo do sacerdote Ebiatar de Shilô, exilado em Anatot por Salomão (1Rs 2,26-27), e que a formação religiosa recebida na família paterna, as lembranças ancestrais e a proximidade das fronteiras do extinto reino do Norte teriam moldado o estilo e o conteúdo de sua mensagem. Mas nada é mais incerto.

De acordo com 1,2, Jeremias foi chamado a ser profeta em 626, quando era “ainda jovem” (1,6). Estas duas indicações biográficas sugerem que ele teria nascido por volta de 650-645. Contudo, não se exclui que o número mencionado em 1,2 (e repetido em 25,3) baseie-se numa tradição tardia a respeito da data da vocação de Jeremias e que esta se situe com maior probabilidade por volta de 609-608. Isto significa que várias hipóteses relativas aos primeiros anos de seu ministério profético repousem sobre fundamentos um tanto frágeis: Jeremias teria saudado com alegria a reforma de Josias em 622; ele teria chegado a colaborar ativamente nesse empreendimento, através da pregação (cf. 11,1-14); por comportar a supressão de todos os santuários, exceto o de Jerusalém, esta reforma arriscava prejudicar os interesses vitais dos sacerdotes que neles serviam, o que explicaria a hostilidade da família do profeta (11,18-22), mais tarde, constatando os escassos resultados da reforma de Josias, que ficou sem perspectivas para o futuro, o profeta teria fustigado, com ardor redobrado, a infidelidade dos judaítas. Todas essas hipóteses são pouco convincentes, não só porque a base cronológica é fraca (isto é, a vocação de Jeremias em 626), mas também porque o livro não menciona de forma alguma essa famosa reforma de Josias (que é elogiado por outras virtudes, cf. 22,15-16) e porque os resíduos do vocabulário e do pensamento deuteronomista, que se percebem em 11,1-14 e que caracterizam o conjunto do livro, admitem uma interpretação diversa (cf. a seguir § 5); e, sobretudo, porque a oposição à mensagem de Jeremias é motivada, de acordo com o próprio testemunho dele, não por eventuais conseqüências materiais da reforma de Josias por ele divulgada, mas pela irrupção desconcertante e até revoltante da palavra de Yaohu por meio de Jeremias (cf. 11,21 e as outras “confissões”).

É mister reconhecer que dispomos de menos informações sobre o início do ministério de Jeremias do que desejaríamos. Em compensação, alguns incidentes posteriores nos são relatados com muitos detalhes, na segunda parte do livro. Em 608, vemo-lo pronunciar um discurso, junto à entrada do templo, que o coloca numa situação muito difícil (cap. 26; cf. 7,1 – 8,3). Em 605-604, ele elabora uma primeira edição de seus oráculos, conservados até então unicamente em sua memória – e, talvez, na memória de alguns de seus ouvintes [cap. 36]. Em 594, Jeremias discute com outros profetas {caps. 27 – 28} e, pouco tempo depois, envia aos exilados em Babilônia uma carta decisiva para a evolução espiritual da diáspora judaica (cap. 29). Finalmente, as disputas com o rei Sedecias e seus funcionários durante o sítio de Jerusalém em 588-587 e sua atividade junto aos sobreviventes depois da queda da cidade são objeto dos caps. 32 – 35 e 37 – 44. Vale a pena frisar que essas informações, embora detalhadas, não constituem uma verdadeira biografia do profeta – a própria posição no texto desafia a exatidão cronológica –; elas representam apenas uma série de exemplos que ilustram a ação da Palavra na existência profética no meio de um povo que atravessa o período mais difícil de sua história.



4. O ministério da Palavra no decorrer dos anos.

A solidão que caracteriza o ministério de Jeremias desde o começo não é apenas o produto de uma experiência religiosa que o singulariza; ela é fruto do conteúdo da mensagem a ele confiada. Essa mensagem defronta constantemente os judeus com o nada, com o abismo do não-ser da comunidade e da criação (cf. 4,23-26). A solidão de Jeremias possui uma dimensão política, pois o ser ou o não-ser de todos depende da aceitação ou da rejeição de sua mensagem. Se sua solidão se prolongar e os judeus se obstinarem recusando escuta-lo, o profeta será efetivamente o único a sobreviver ao desastre universal. Ao contrário, se encontrar audiência, o desastre será evitado, ou, ao menos, atenuado, abrindo-se uma nova perspectiva de bem-estar. A mensagem contestatária de Jeremias exige imperativamente escolhas radicais. Pare ele, como para a maioria dos profetas, a Palavra é necessariamente palavra total, envolvendo todos os aspectos, pessoais e comunitários, da vida humana.

Podemos identificar três períodos no ministério de Jeremias.

a) O primeiro vai desde a vocação (data incerta) até aproximadamente 605, ano da batalha decisiva de Karkemish. Sob o reinado de Josias, morto em 609, Judá vive, primeiro, um período de calma, caracterizado por certa prosperidade. A Assíria deixou de dominar o mundo, e Judá goza de uma ampla liberdade, da qual Josias tira proveito para ampliar o território e promover todo tipo de reforma. Depois de sua morte, a região gravita, durante alguns anos, na órbita dos egípcios, sem, porém sentir tal jugo como particularmente duro. Trata-se, para Judá, de anos relativamente pacíficos, excetuando a escaramuça – se realmente houve uma! – de Meguido, fatal apenas para Josias (cf. 2Rs 23,29). É justamente durante esses anos que Jeremias é obrigado a anunciar uma mensagem completamente estranha: através de poemas dotados de extraordinário poder evocador, ele descreve a chegada de um exército invencível que, vindo do norte, vai se abater sobre Jerusalém e Judá (cf. especialmente caps. 4 – 6), exército implacável, que não deixaria nenhuma esperança aos vencidos – a menos que estes se convertessem a Yaohu antes que fosse tarde. Jeremias sabe que a inverossímil advertência que ele é encarregado de dar aos seus conterrâneos não tem chance de encontrar reação favorável. O povo e seus dirigentes estão demasiadamente seguros de si, convictos de que suas instituições são inabaláveis, destinadas a durar para sempre (cf. 18,18; 8,8). Em caso de necessidade, eles terão sempre como último refúgio o templo e sua secular inviolabilidade (cf. 7,4.10). Além disso, depois de uma sondagem cuidadosa junto às diversas classes da população, Jeremias deve render-se à evidência: o povo todo, dirigentes e súditos, exploradores e explorados, está corrompido (cf. 5,1-6), irremediavelmente perdido – um negro pode por acaso mudar de pele? Uma pantera, de pêlo? E os judaítas, acostumados a praticar o mal, poderiam praticar o bem (13,23)? – Essa mensagem, contudo, sem nuanças (é tudo ou nada), não será levada a sério. A reflexão do profeta é abstrata demais, ela não casa com a realidade, que nunca é totalmente preta ou totalmente branca, e sim, sempre um pouco preta e um pouco branca. O que ele fala paira nas esferas nebulosas de um conhecimento de Yaohu em flagrante contradição com aquilo que a tradição ensina – pois Yaohu é um Deus próximo, familiar (cf. 23,23), que não abandona os seus. O gesto eloqüente do rei Joaquim que, imperturbável, destrói, pedaço por pedaço, o rolo que contém esses textos inacreditáveis, expressa bem o fracasso da pregação de Jeremias durante todo esse primeiro período de seu ministério (cap. 36).

b) O segundo período, que vai de 605 a 587, desde a ascensão de Nabucodonosor ao trono à destruição de Jerusalém, é, sob muitos aspectos, o mais significativo no ministério de Jeremias. Suas profecias relativas a uma invasão militar, de repente, se realizam. Repetidamente, o rei dos babilônios invade com seus exércitos vitoriosos a Síria e a Palestina, decidida a impor sua vontade a todos os pequenos estados que encontra no caminho. A independência de Judá acabou. Mesmo assim, os responsáveis pela sua política não chegam a um entendimento sobre as medidas a tomar.

A maioria opta decididamente por uma política voltada a reconquistar a independência; pensa-se numa aliança com o Egito, sempre disposto a manter os babilônios a boa distância, e com os vizinhos pequenos, igualmente ameaçados pelo avanço dos babilônios. Esta dura política goza do manifesto apoio do chefe de estado, o rei davídico.

Uma minoria, contudo, está disposta a se acomodar à tutela babilônica, na esperança de conservar certa autonomia no âmbito do império de Nabucodonosor. Os nomes de vários membros eminentes do partido favorável aos babilônios foram conservados graças ao livro de Jeremias: Ahiqâm, poderoso protetor de Jeremias (26,24), seu filho Godolias, que será nomeado governador da província, após a queda de Jerusalém, e Baruk ben Neriá, a pessoa que ajudou Jeremias a editar seus oráculos. Seria errado considerar Baruc como um simples “escriba”, um personagem de segunda monta a serviço de Jeremias, uma espécie de estenógrafo que teria estado à disposição do profeta para facilitar sua tarefa. Baruc era, ao contrário, um sofer, isto é um secretário de estado, um alto funcionário então, quase um chanceler, portanto uma personalidade de destaque, assim como o seu irmão Seraiá, que se tornará chefe de distrito na administração babilônica (cf. 51,59). Aliás, o prestígio de Baruc era tal que era considerado como uma das lideranças do partido pró-babilônio e como o verdadeiro instigador dos oráculos de Jeremias (43,3).

A alternativa política se apresenta em termos extremamente claros: ou se aposta na liberdade – ou algo parecido, já que o Egito estará pouco disposto a se retirar depois de ter auxiliado Judá –, sob o risco de perder tudo em caso de derrota; ou se aceita a integração no sistema político dos babilônios.

Sem querer, Jeremias se vê envolvido nessas discussões. A sua posição é clara: é necessário aceitar a supremacia de Babilônia. Não por oportunismo (Jeremias não é um político), mas porque essa é à vontade de Yaohu. Aquilo que Yaohu deseja não é um estado judaíta independente e forte, com o poder firmemente assentado nas mãos de uma dupla hierarquia, civil e religiosa, e sim, um povo que lhe seja fiel, que responda ao seu apelo paterno (cf. já 3,22 – 4,4), preocupado em defender o direito e em viver na harmonia (cf. 22,13; 23,5-6 e já 5,1-3). Na opinião dele, o partido favorável à independência caracteriza-se pelo desprezo de todos os valores que agradam ao ETERNO, sendo o rei o principal responsável (22,13-17). É por causa disso que Yaohu decretou o fim do Estado. Ele pensa num projeto completamente novo: no seio do império babilônico, Yaohu se propõe criar, com aqueles que se submetem a seu julgamento, uma comunidade renovada, que não procure mais a própria glória, mas desejosa de atender ao bem estar de todos, já que a prosperidade dos outros é a condição da sua (29,5-7). Esta comunidade conhecerá finalmente, após a volta feliz à terra dos ancestrais, uma maravilhosa interiorização dos compromissos outrora assumidos com o ETERNO, a tal ponto que não será mais necessária nenhuma hierarquia mediadora entre Yaohu e os homens (31,31-34). Esta mensagem supera a visão de 3,15 e 23,6, conforme a qual o ETERNO dirigiria o seu povo com a ajuda de pessoas totalmente consagradas a ele; ela divisa a total realização da Aliança da Jerusalém celeste.

c) O terceiro período do ministério de Jeremias começa depois de 587, isto é, depois da catástrofe de Jerusalém. Período cuja importância é freqüentemente subestimada, porque se esquece que, apesar das deportações efetuadas pelos babilônios (envolvendo apenas algumas camadas da população) a maioria dos habitantes ficou em Judá. No meio dessas massas sem rumo, iam aparecendo três tendências. Uma delas, sustentada pelas lideranças do antigo partido pró-babilônico, em particular por Godolias, visava reconstruir o país sob a égide babilônica. Jeremias pertencia a esse grupo. Outro grupo, dirigido por Iishmael, homem sem escrúpulo e que contava com o apoio do rei amonita, pretendia continuar a luta, praticando atos de terrorismo (cf 41,10). Finalmente, um terceiro grupo, animado por um certo Iohanan ben Qarêah, preferia expatriar-se para o Egito. Contrariando um oráculo de Jeremias que desaconselhava essa conduta, este grupo realizou os seus projetos, levando consigo o profeta, cujo rastro se perde no longínquo Egito.



5. A formação do livro. As grandes articulações do livro de Jeremias são bastante simples:

1,1 – 25,14: Oráculos e ações simbólicas de Jeremias dirigidas contra Judá;

26,1 – 45,5: Oráculos de salvação para Israel-Judá e relatos acerca do ministério de Jeremias;

46,1 – 51,64 (com uma introdução em 25,15-38): Oráculos contra as nações estrangeiras;

52,1-34: Anexo histórico baseado em 2Rs 24,18 – 25,30 (com a inclusão de algumas novas informações): A queda de Jerusalém.

Na versão grega, os oráculos contra as nações estrangeiras estão inseridos imediatamente depois de 25,13. Esta disposição representa provavelmente um estágio mais antigo do rolo, pois constata-se que vários outros livros proféticos (Is 1 – 39; Ez; Hc; Sf) foram compostos de acordo com o esquema tripartido que situa os oráculos contra as nações entre os oráculos de desgraça contra Israel e os oráculos de salvação para Israel.

No interior de cada uma das grandes partes do livro, percebem-se seções menores, composições coerentes, blocos de oráculos que parecem ter existido sob forma de folhetos ou de livros independentes, antes de serem inseridos na grande coleção de textos. Notamos, por exemplo, coleções como 22,11 – 23,8, reunindo oráculos sobre “a casa de David”; 23,9-40: “Sobre os profetas”; 30,1-31.40: o “livro” (30,2) que anuncia a restauração do novo Israel. Ainda, composições como o capítulo 2; os caps. 4 – 6; 14,1 – 15,4. Etc. poderiam ser contados entre as coletâneas jeremianas que precederam a formação da coleção definitiva.

No que diz respeito à composição da primeira parte do livro (caps. 1 – 25), o episódio do rolo escrito por Baruc, destruído por Joaquim e recomposto numa edição ampliada (“e ainda foram acrescentadas outras palavras semelhantes”, 36,32), desempenha um papel importante nas considerações dos exegetas. Este rolo continha os oráculos ameaçadores pronunciados antes de 605, e é bem provável que seu conteúdo tenha entrado no material atualmente reunido em Jr 1 – 25. A sagacidade dos exegetas se tem esforçado bastante para identificar esses textos, mas as pesquisas conduziram a resultados contraditórios e não se chegou até agora a um consenso. Por enquanto é melhor renunciar à reconstrução desse “rolo primitivo”.

O problema se complica pelo fato de os caps. 1 – 25 conterem, ao lado dos oráculos poéticos, de autenticidade indubitável, um grande número de passagens, mais ou menos longas – às vezes capítulos inteiros –, redigidos numa prosa, que pelo vocabulário e pensamento teológico, lembram o trabalho dos editores deuteronomistas, que durante o exílio redigiram o grande afresco histórico atualmente encontrado nos livros denominados “profetas anteriores” (cf. Introdução aos Livros Proféticos). Assim como estão, essas passagens não devem ser consideradas como obra pessoal de Jeremias, sendo necessário admitir, ao menos, que elas representam oráculos de Jeremias reelaborados por editores posteriores.

Na segunda parte do livro, os relatos sobre o ministério de Jeremias são comumente atribuídos a Baruc. Pensa-se nele como autor, por causa das informações precisas que os relatos contém, representando, sem dúvida, as observações de uma testemunha ocular dos acontecimentos, e também porque terminam com um oráculo pessoal dirigido a Baruc. Essa atribuição, embora possível, não é nada segura. O autor acompanhou provavelmente Jeremias no Egito (cf. os caps. 43 – 44), e o versículo 43,6 nos informa que Baruc, antigo líder do partido pró-babilônico, foi levado à força para o Egito, junto com Jeremias.

No início do tempo do Exílio existiam portanto numerosos livrinhos, folhetos e coletâneas dispersas e ainda, provavelmente, algumas tradições orais relativas a Jeremias. Um redator anônimo reunirá todo esse material num único volume. Ignoramos a identidade desse redator; contudo, ele se entrega nos inúmeros acréscimos, composições coerentes (discursos, um ou dois relatos) e comentários de estilo deuteronomistas que acima mencionamos e que balizam quase todos os capítulos do livro. O redator final do livro de Jeremias pode ser tranqüilamente associado à escola “deuteronomista”. Devemos admitir que a Palestina manifesta, por volta da segunda metade do séc. VI, uma intensa atividade literária e teológica; um trabalho de reflexão, de pesquisa e de edição, que consistia em colecionar e interpretar documentos, reuni-los em volumes compactos e deles tirar as conclusões que se impunham em vista de uma melhor compreensão do destino de Israel.





VAMOS AS PRINCIPAIS PERSONAGENS DE JEREMIAS:



JEREMIAS.

Pontos fortes e êxitos:

Escreveu dois livros do Antigo Testamento: Jeremias e Lamentações.

Ministrou durante o reinado dos últimos cinco reis de Judá.

Foi um incentivador da grande reforma espiritual que ocorreu no reinado de Josias.

Agiu como um fiel mensageiro de Yaohu, apesar de ter sofrido muitos atentados contra a sua vida.

Ficou tão profundamente entristecido com a condição decaída de Judá, que ganhou o título de “profeta chorão”. (O que discordo plenamente... Pois quando sofremos pelos outros em nome de Yaohu – somos rotulados como o foi Jeremias. Um absurdo. Anselmo Estevan.).





Lições de vida:

A opinião da maioria não é necessariamente a expressão da vontade de Yaohu.

Embora o castigo pelo pecado seja severo, há esperança na misericórdia de Yaohu.

Yaohu não aceitará uma adoração vazia ou que não seja sincera.

Servir a Yaohu não garante segurança terrena.





Informações essenciais:

Local: Anatote.

Ocupação: Profeta.

Familiares: Pai – Hilquias.

Contemporâneos: Josias, Jeoacaz, Jeoaquim, Joaquim, Zedequias e Baruque.





Versículos-chave: “Então disse eu: Ah! ETERNO YAOHU! Eis que não sei falar; porque sou uma criança. Mas o ETERNO me disse: Não digas: Eu sou uma criança; porque, aonde quer que eu te enviar, irás; e tudo quanto te mandar dirás. Não temas diante deles, porque eu sou contigo para te livrar, diz o ETERNO” (Jr 1,6-8).

A história de Jeremias é contada no livro que tem o seu nome. O profeta também é mencionado em Esdras 1,1; Daniel 9,2; Mateus 2,17; 16,14; 27,9.

(Veja em 2 Crônicas 34 e 35 a história do avivamento espiritual durante o reinado de Josias.).

INTRODUÇÃO AO LIVRO DE:





LAMENTAÇÕES de JEREMIAS:







INTRODUÇÃO







Visão geral

Autor: Desconhecido.

Propósito: Expressar e orientar outros em suas expressões de lamento sobre as terríveis condições impostas sobre Jerusalém e sobre o povo de Yaohu pelos babilônios.

Data: c. 586-516 a.C.

Verdades fundamentais:

Judá e Jerusalém mereceram a decisão que resultou do julgamento divino a que foram submetidas.

Não fosse o alívio proporcionado pelo lamento, a dor da destruição e do exílio seria maior do que as pessoas poderiam suportar.

A única esperança de libertação do sofrimento causado pelo exílio era apelar a Yaohu para que fosse misericordioso.







Propósito e características

O propósito de Lamentações foi cumprido na própria execução do livro e, depois, na sua aceitação por outros como um meio de conformar-se com a destruição de Sião. O livro apresenta três perspectivas harmoniosas sobre a ira de Yaohu vertida em grande quantidade contra Judá por meio dos babilônios.

Primeiro, o livro afirma que a destruição e o exílio foram conseqüências justas do pecado. Os profetas haviam repetidamente advertido Judá de que, se o povo continuasse a violar a aliança que Yaohu havia feito com eles, o julgamento aconteceria. Muito antes de Jeremias, Amós falou sobre um dia do ETERNO contra o seu povo (Am 5,18), e esse dia havia chegado (Lm 1,12). Os profetas haviam recorrido aos princípios da aliança, expressos mais enfaticamente em Deuteronômio, os quais estabelecem uma forte ligação entre a fidelidade do povo ao ETERNO e a sua permanência na Terra Prometida. Em parte, o propósito do livro era justificar a punição de Yaohu imposta a Judá e defender os profetas que haviam anunciado o julgamento com antecedência.

Segundo, expressar a forte resistência emocional ao julgamento de Judá. Teria sido excessivo o julgamento de Yaohu sobre o seu povo (2,20-22)? Seria certo ele se comportar como um inimigo do seu próprio povo (2,4ss.)? Essas expressões honestas tornaram o livro poderoso na sua época e o fazem poderoso ainda hoje, quando os sentimentos de angústia e abandono novamente permeiam a alma.

Terceiro, o livro afirma que o ETERNO ainda é um Deus de misericórdia e fidelidade (veja 3,22-36). Lamentações expressa uma fé sincera de que o exílio terá um fim. Também expressa a esperança de que haverá reparação para a culpa de Judá e que os seus inimigos serão julgados pelos crimes que cometeram contra o povo. Essa esperança reflete uma compreensão da soberania de Yaohu sobre todas as nações, uma soberania que assegurou o cumprimento de todas as suas promessas pactuais (veja 3,37-39).







CHRISTÓS, “O UNGIDO” –, EM LAMENTAÇÕES

(Yaohushua):



Lamentações aponta, de diversas maneiras importantes, para além da situação do exílio, para Yaohushua. Em sua humilhação, O UNGIDO sofreu um tipo de exílio em razão de sua expiação substitutiva pelo povo de Yaohu. Nos dias anteriores ao seu próprio grito de abandono como parte do seu sofrimento redentor (Mt 27,46), O UNGIDO pronunciou o seu lamento pessoal sobre Jerusalém (Mt 23,37; Lc 13,34-45). A exaltação de Yaohushua deu início ao fim do sofrimento do povo de Yaohu. Ele assumiu o seu trono e continuará a reinar, subjugando, finalmente, todos os seus inimigos. Lamentações também proporciona aos seguidores de Yaohushua um meio de expressar os seus próprios lamentos sobre as condições de vida do povo de Yaohu no presente. Embora Yaohushua tenha inaugurado o reino de Yaohu e a exaltação do povo de Yaohu, a Igreja continua a sofrer privação e exílio (1Pe 1,2). Lamentações afirma que, num mundo de dor e injustiça, Yaohu ainda é bom e que um dia ele trará toda a bondade “para os que esperam por ele” (3,25).





LAMENTAÇÕES: 1. Na Bíblia hebraica, o nome deste livro é tomado da primeira palavra dos dois primeiros e do quarto poema: Eiká (lit. “Como!” também traduzido por “Oh!”). Cf. Is 1,21; Jr 48,17. Mas o título grego, que se tornou tradicional – inclusive no Talmud –, corresponde bem ao gênero hebraico do “lamento”, ao lado do canto fúnebre (cf. 2Sm 1,17ss.), pode aplicar-se também a uma catástrofe nacional. A catástrofe aqui em foco é a tomada de Jerusalém e a destruição do Templo em 587 por Nabucodonosor, que deportou para Babilônia parte da população. Por isso, os judeus lêem esse livro no dia nove de ab (o quinto mês, iniciando-se o ano com a Páscoa), que coincidência curiosa – marca não somente esse aniversário, mais também a queda do Segundo Templo sob os golpes dos romanos. Cf. Já Jr 41,5.2.

2. A Septuaginta atribui esta livro a Jeremias, talvez com base em 2Cr 35,25, onde, de fato, se fala de um canto fúnebre sobre Josias. Na realidade, Lm 4,20 não se coaduna absolutamente com aquilo que Jeremias pensava a respeito de Sedecias (Jr 24,8; cf. 23,6). Por outro lado, a doutrina sobre a retribuição expressa em 5,7 é combatida por Jr 31,29-30, da mesma forma que a Aliança com o Egito em 4,17 é impugnada por Jr 37,5-7 (comparem-se Jr 2,18 e Lm 5,6); e seria contraditório que Jeremias tenha podido pronunciar Lm 2,9. Diga-se que esse último texto é um indício de que estes cantos foram escritos na Palestina – de onde Jeremias esteve ausente depois da forçada fuga para o Egito (Jr 43,6) – e não na Babilônia, onde Ezequiel tinha certa audiência (cf. Ez 8,1) e não poderia ter sido assim ignorado. Mais: as diferenças de forma e de fundo demonstram que talvez se trate de cinco poemas de origem diversa. Por isso, as Lamentações não são de autoria de Jeremias; segundo alguns, elas teriam mesmo sido escritas “contra” Jeremias e o partido pró-babilônico, que podia ser visto como o inimigo interno enquanto se aproximava o invasor.

3. Os quatro primeiros poemas são alfabéticos, sendo que o começo dos vinte e dois versos alista em ordem as vinte e duas letras do alfabeto hebraico. Mas há uma leve diferença na ordem do alfabeto entre o primeiro poema e os três seguintes; e no terceiro, o alfabetismo é tríplice, incidindo no começo de cada um dos três membros de cada verso. Essa técnica podia auxiliar a memorização e, além disso, indicar que o assunto estava completamente tratado, como costumamos dizer, “de A a Z”.

No que tange ao assunto, as duas primeiras e as duas últimas são lamentações de cunho político; aí Sião representada sob os traços de uma mulher (ressalvando a quinta, que é uma queixa coletiva); mas a terceira parece ser vazada em prisma individual e destaca um homem, cujos aspectos em sua maioria fazem pensar em Jeremias Sofredor; é verdade que se poderia ver nesse homem uma representação do Povo inteiro, sob os traços do profeta encarnado os sofrimentos de sua nação. Seria este, de certo modo, o mais antigo comentário sobre os outros poemas, agora situado, em vista dessa finalidade, no centro das lamentações nacionais.

4. O anonimato e a diversidade levantam a questão da data. É difícil categoricamente uma determinada ordem de composição, mas está claro, em todo caso, que todos os poemas datam de antes do fim do Exílio em 538 e, mesmo, que muitos detalhes (notadamente no segundo e no quarto poema) revelam proximidade com os acontecimentos de 587. Pode ser até que o primeiro poema remonte à época da primeira deportação, em 598.

A tristeza na miséria física e moral da catástrofe política e religiosa, o arrependimento em relação à conduta pecaminosa, que forçou Yaohu a aniquilar o seu povo, e a esperança da fé no ETERNO, mestre da história, infundem nesse livro uma beleza trágica e expressam uma mensagem, que, embora ligada a estas circunstâncias particulares, permanece atual através dos tempos.

5. As Lamentações deploram o luto de Jerusalém (1,1.4; 2,8; 5,15): ela está prostrada em lágrimas (1,2.16; 2,11.18; 3,48s.), em gemidos (1,4.8.11.21.22), em aflição (1,4.5.8.12; 3,32s.), em estado solitário (1,4.13.16; 3,11; 4,5; 5,18), em desnudamento (1,8) e fome (1,11.19; 2,12.19; 4,4.5.8-9; 5,6.10).

Está ferida nos seus seres mais queridos: as crianças (1,5.20; 2,4.11.19.20.22; 4,4.10; 5,13), as jovens: (1,4.18; 2,4.10.21; 5,11), os jovens (1,15.18; 2,21; 4,7; 5,12.14), os anciãos (1,19; 2,10.21; 4,16; 5,12.14), os sacerdotes (1,4.19; 2,6.20; 4,16), os profetas (2,9.20) e os reis (1,6; 2,2.6.9; 4,20; 5,12). Está profanada em suas realidades mais santas: o Templo (1,4.10; 2,1.4.6.7.20) e a assembléia fiel ao Encontro divino (1,4.10; 2,6.7.22).

Em sua aflição e graças a ela, a Cidade Santa toma consciência de seu pecado, que é revolta (1,5.14.22; 3,42), desobediência (1,18.20; 3,42), falta (1,8; 3,39; 4,6.13.22; 5,7.16) e perversidade (2,14; 4,6.13.22; 5,7). Esse pecado, ela o confessa (3,42; 5,7.16), pecado que faz pesar sobre ela a sua mão, que não é senão a mão dos inimigos (mais de vinte vezes nomeados) e, no fundo, a mão do próprio Yaohu (1,14).

Com efeito, é Yaohu que faz descobrir aos seus filhos a rejeição absoluta de todo mal, rejeição que provoca a sua ira (1,12; 2,1.3.6.21.22; 3,43.66; 4,11), o seu furor (2,4; 4,11), a sua fúria (2,2; 3,1), sua chama aterradora (1,13; 2,3-4; 4,11). É ele, a quem os pecadores encaram como um inimigo (2,4-5; 3,1-18.43-45): ele aflige (1,5.12), entristece (2,1) e traga (2,1-8). Ele parece, então, longínquo (1,16), e, todavia está sempre perto (3,57), ouve (3,56.61), vê (1,9.11.20; 2,20; 3,50.59-60.63; 5,1), se lembra (3,19; 5,1.20).

Pode-se confiar nele, pois é justo (1,18; 3,34-36), todo-poderoso (3,37-38; 5,19), fiel (3,32), Salvador (3,26), redentor (3,58), capaz de consolar (1,16) e tão bom (3,25) que manifesta entranhas, que dizer, ternuras materiais, renovadas todas as manhãs (3,22-23). A desgraça, fruto do pecado, é de sua parte a graça suprema: ela conduz à humildade confissão e finalmente à conversão, não propriamente à conversão que o homem pretenderia realizar por si mesmo (3,40), mas à conversão que somente Yaohu pode operar no homem: Faze-nos voltar a Ti, ETERNO, e voltaremos (5,21).

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